short list
A touca de bebé do meu pai e a boneca de loiça da mãe dele, um dos capacetes do meu avô, a minha pistola cor de rosa e a secretária de viagem do Gomes Freire. O meu Anjo da Guarda de borracha, que bem me tem servido e que por acaso está em Lisboa mas que tem que vir para cá e este boneco, o "bebé da mãe". Nunca teve outro nome e era, como se percebe, da minha mãe, já se vê. O bibe deve ter a minha idade e em 50 anos foi sempre o mesmo. Normalmente assistia sentado numa cadeira de madeira aos lanches que eu fazia sozinha com as outras bonecas e deve ter aturado as minhas histórias imaginadas, os sucessivos gatos e o eterno conto do "menino com rabo de bacalhau" que o meu pai pacientemente inventava e me contava todas as noites até eu adormecer. Sobreviveu à rivalidade com o Felipe, um bebé gordo de olhos azuis que me deram numa ida a Badajoz e que em tempos foi louro e composto até eu lhe cortar o cabelo e continua no meu quarto. O outro foi parar à arca das minhas coisas juntamente com a pasta cor de rosa da escola e a maravilhosa t-shirt azul turquesa do Franjinhas a dizer Teresa. Talvez abençoado pelos anos que esteve fechado numa gaveta juntamente com coisas da capela está como sempre o conheci: impávido, com ar de bebé lavado a cheirar a água de colónia, sem um dedo e pronto para outra geração.
Depois claro, desenhos dos meus filhos, livros (alguns insistem em andar sempre comigo de um lado para o outro) e fotografias. Destas, as mais importantes, as que têm cheiro e sabor, antigas e mais recentes, estão na minha cabeça onde se vão juntando num filme do qual alguns episódios vão fazendo cada vez mais sentido. Vendo bem, e tirando os livros e as tais fotografias , quase nada disto é de agora. Todas elas são coisas que, de uma maneira ou de outra, me foram trazendo até chegar até aqui. Quanto ao boneco, talvez um dia tenha a sorte de ter uma neta que brinque tanto com ele como eu brinquei e que, quando crescer, perceba que estas são as melhores coisas que se podem receber.
E melhor ainda se for aqui na Quinta. E sempre com o Anjo da Guarda.
Comentários
Enviar um comentário